Foi durante um café da manhã de domingo em família, coisa de 18 anos atrás, que Sarah Oliveira ouviu a tia dela, Linda Caldas, falar de uma rede, ainda embrionária, de conservação do Cerrado através da propagação de sementes nativas. “Depois que ouvi a proposta e disse: que legal! Meu nome já estava entre os sócios-fundadores”, brincou a Associada Fundadora e ex-Presidente da Rede de Sementes do Cerrado (RSC), Organização Social da Sociedade Civil de Interesse Público(OSCIP) que completa 18 anos nesta sexta-feira (5).
Idealizada pelos professores Manoel Cláudio da Silva Júnior e Linda Styer Caldas, a instituição teve seu início em 2004 como um projeto do Fundo Nacional do Meio Ambiente. Na época, a equipe da professora já identificava a escassez de sementes de espécies nativas para a restauração do Cerrado.
Prestes a finalizar o projeto, Linda decidiu transformar a Rede em uma ONG. “Ela acreditava que o terceiro setor era o caminho para a transformação da realidade do Cerrado. Hoje a gente colhe os frutos plantados por essa pessoa visionária”, conta Sarah em entrevista ao Semeando, o Podcast da Rede de Sementes do Cerrado. O episódio especial em homenagem aos 18 anos desta associação sem fins lucrativos, que surgiu com o propósito de fomentar a cadeia de produção de sementes no bioma Cerrado, foi ao ar nesta sexta-05 e está disponível no Spotify e canal do YouTube da RSC.
Durante o bate-papo, Sarah conta que teve a carreira fortemente influenciada pela tia. É bióloga, como Linda, e “herdou” – brinca ela – a Rede após o falecimento da fundadora, se tornando a segunda presidenta da instituição, em 2008. “Uma das principais contribuições da Rede foi a legalidade de toda as suas ações. Nós atuamos muito na parte da legislação que regulamenta a coleta de sementes, produção de mudas e da obrigatoriedade da restauração. Ela registrou todas as espécies na época para que o Ministério da Agricultura tivesse a lista. É só um exemplo do que era importante para ela”, destaca.
Professora do Departamento de Botânica da UnB, Sarah Caldas avalia que as ações em prol da conservação e restauração do bioma evoluíram, principalmente quanto a políticas públicas, projetos, pesquisas e parcerias, mas o caminho até o cenário ideal ainda é longo. “Essas questões políticas, ambientais e sociais no Cerrado têm evoluído e nós podemos dar mais atenção a isso”, acrescenta.
Protagonismo feminino
Um dos pontos fortes da RSC é o protagonismo das mulheres, tanto na gestão da instituição, que sempre teve mulheres na presidência, quanto no campo, realizando a coleta de sementes nativas. “Minha tia estaria dando pulos de alegria hoje em dia, se pudesse ver o que a Rede se tornou e a autonomia que adquiriu. Com certeza ela teria muito orgulho desse poder transformador de vidas e pessoas”, homenageou Sarah.
Linda Caldas
Nascida nos Estados Unidos, Linda Styer Caldas se mudou para o Brasil no início da década de 1970. Doutora em botânica, ela começou a trabalhar imediatamente na Universidade de Brasília (UnB), atuando nas áreas de extensão e pesquisa.
Na universidade, ela implantou o Laboratório de Cultura de Tecidos Vegetais, tornando-se uma das pioneiras nesse tipo de pesquisa no Brasil. Desenvolveu estudos nas linhas de Ecofisiologia de Plantas Nativas do Cerrado e Cultura de Tecidos de Plantas.
Em 2001, Linda articulou um grupo de defensores do Cerrado para concorrer a um Edital com o objetivo de criar redes de sementes florestais no Brasil. À iniciativa foi contemplada e, durante a execução do projeto, entre os anos de 2001 e 2003, foram realizadas pesquisas pioneiras sobre o bioma. O financiamento do edital chegou ao fim, mas o grupo não, e foi assim que Linda e um grupo de entusiastas fundou a Rede de Sementes do Cerrado.
Visionária, a professora era considerada uma mulher à frente de seu tempo, transitando com facilidade entre temas ambientais, sociais, novas tecnologias e até legislação. Linda Styer Caldas faleceu em 2006, aos 61 anos.
*Sarah Caldas Oliveira é graduada em Ciências Biológicas e mestre em botânica pela UnB. Possui doutorado em ecologia e recursos naturais pela UFSCar. Atualmente é professora do Departamento de Botânica da UnB. Casada e mãe de duas filhas, Sarah faz parte da Rede desde a fundação.
Publicado em 05/08/2022